terça-feira, 14 de setembro de 2010

Um verbo vazio e branco

Existe uma euforia no vazio, e
O poema é palidamente colorido.
A raiva emancipa-se do verbo
Vazio e branco,
Como a besta que ruge,
ainda aprisionada.

Existem felizes e agoniantes,
coloridos sem cor
saberes falsos
Existem mistos de nada saber.

O que resta?
O dia a dia burocrático

domingo, 18 de julho de 2010

Auto-Biografia dum homem carente

Passo os dias a retratar-me em letras,
- talvez demasiados dias para aquilo que sou.

Sou apenas aquilo que sou:
Nada mais.

Tudo é demasiado rápido e confuso,
menos as minhas letras:
elas deixam-me ser apenas o ser.

Sou feito de hipérboles e versos metafóricos,
tentativas de rasgos de moralidade
lancetados pela razão.

Tudo é demasiado sufocante.
Aquilo que sou?
As minhas letras o escrevem

domingo, 1 de novembro de 2009

Sleepless Heart




Hoje, só hoje
(o melhor será dizer todos os dias)
revivo, no teu último deserto,
ainda, aquilo que eras.

Perdeste, nas searas alentejanas,
das casas brancas (as da verdade),
e dos montes amarelos
de pelas enrugadas pelo trabalho,
a sintonia do coração.

Desejara, um dia, ter sido contigo,
mas, como em tudo humano, que acaba,
já não havia o brilho -
daquele que houve, lembras?
Mas teve de acabar...
O amor é decadente (tu sabes)
como qualquer coisa mundana,
(embora te pense, ainda,
com algum brilho que, porventura, restou -
como o nosso Alentejo).

E sabes porque acabou, meu amor?
porque insistimos no ainda,
quando no primeiro roçar de lábios
tudo vacilou, resvalou...
(qualquer sinónimo que queiras).
Esse foi o nosso mal:
alimentámos o ainda tormentoso,
na esperança de dizermos palavras de veludo,
e elevarmos os rituais de gestos rudes...

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Valsa dos 5 tempos




Imagina
Quando o sol se esconde atrás do serrado
e atravessamos a ponte que calca o rio,
o violino dos sonhos,
e os animais mugindo pela dor dos serrados...
Imaginas?

E o mudo poeta,
que serra as montanhas
e silenciosamente se livra do ser,
do saber, dos instrumentos?
Imaginas?

Não imagines.
As utopias são noites de mentiras
para quem sonha,
São valsas dos cinco tempos que se perpetuam
e fazem doer do vazio sem face,
até ao acordar do mais ingénuo dos seres
que atravessa os sons do desespero...

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Perdido, mas encontrei-te



Perdido
nos campos de trigo,
acompanhado pelos sóis
que embebiam no difundir da tua imagem,
e,
enquanto sentada, sentias a espuma do mar...

E eu?,
via-me envolto em grandeza,
por ver a tua cerca aberta
que provocava o ócio,
por te ver a girar em rodopios de sabores,
de sorrisos, de alegrias, de tristezas até...

Mas tu,
tornavas os problemas em aventuras
e celebravas com o mar a mestria,
enquanto podia subir à minha galé
e deitado, saborear-vos (só a vós)
nessa vossa harmónica agitação.

Fui perdido outrora;
O mar que hoje saboreias
tornou-se desleal,
e perdi-o...
Mas hoje veio ter contigo,
Não deixes que ele fuja
(é o pedido que te faço)

Não deixes que fuja,
porque não poderei mais,
sentir o perfume dele (e o teu)

Vem comigo,
para que possamos repousar, em ti,
e jantarmos ao sabor deste mar
só nosso

sexta-feira, 13 de março de 2009

Arte deliberada em não querer pensar



No baptismo da manhã primaveril
ao sabor do violão,
e do som nostálgico do absinto das letras
forçara-me sobre algo,
a rasurar qualquer apologia,
simbioses entre o que parecia ser belo,
(sinónimos de luxo,
que me suportavam à transcendência)
e relações de poder em que podia divagar;
O sofrimeto, o amor, a morte:
podia espezinhar qualquer tormento pensativo.

Mas nunca pensei sobre a morte - nunca quis:
já era caro pensar, demasiado caro...
Talvez seja a (única) verdade que temos - a morte
Já o afirmara o senhor do País Possível

Ao menos não a tenho de tributar como troca de algo;
Quero acreditar nessa profecia,
não quero outra

Mas se gasto os suores desta manhã liberal,
que acrescenta intelecto, ao ego frio,
e escraviza o carácter,
Não estarei já a moderar a reflexão na morte?

(Silêncio)

Já não desejo escrever
A manhã soalheira virou tarde de desculpas
Já não quero poder na retórica deste pensamento,
É caro, muito caro, a morte
(a verdade)

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Lusa saudade...



Jazia onde o cânon me impedira
de assentar a caneta no muro lacustre
e me proibia matizar as lembranças
da cidade dos cheiros e dos sabores,
esquecida pelos homens,
que saqueavam a sua prudência...

Mas tinha de voltar às minhas origens...

O sintoma jacobino da elite
que forçara a romper a carapaça
do que alguma vez tinha (e desejava ter) sido,
e voltei, assim, no barco a vapor que fumegava
o iníquo da minha alma para me transformar
no simples ser que vagueia ao sabor da maresia.

Já sentia, Lisboa nossa, a saudade
(Irónico o termo... a saudade é só nossa;
Nem pertence à elite inglesa (astuta)
que presunçosamente sabe de tudo)

Regressei à tua miséria,
Como lacaio que vem saborear o verde do poder...
(Essa era a minha saudade):
Terra lusa, casa da minha saudade,
tive de regressar a ti;
Já não aguentava mais o sangue
que subia a garganta pelo desespero,
pelo medo animalesco que me lancetava,
por sentir a tua falta (a tua saudade)

Voltei. Estamos juntos de novo;
O renovar do desejo soturno,
que devolvia o necessário silêncio,
para escrever nas tuas paredes
as poesias líricas, que exaltavam
o sigiloso sentido que me fazia envolver contigo,
terra minha, lavrada da estrumeira dos altos,
onde só em ti encontrava a minha saudade...

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Canção à mãe


No recanto sórdido do meu espaço,
Guardado de ti,
Por toda aquela biblioteca do saber

Favorecias, como parte de ti,
a razão do ser que só a mim pertencia...
O sofismo que rodavas no pensamento
para ser parte da tua projecção no masculino

Seria justo o sufoco,
por não quereres ambicionar mais?
(Mas que posso, eu, divagar sobre o justo...?)

Bem sei da nossa corcunda agitação.
E sei que merecias - talvez também eu merecia...

Descobri todas as questões do ser - ou não,
mas ergui-me do meu cadeirão burocrático, por ti
e limitaste-me dos numerosos senhores sem razão:
Obrigado,
Mas não podia, senhora,
Ficar apenas erguido, enquanto te deixava
Sozinha, sem mim, fazeres o meu puzzle
E levares-me o desejo teu (não meu),
Febril, orgulhoso, um desejo de fé...
de tudo aquilo que querias que fosse por ti

São árduas as linhas que te esboço.
É tarde.
As palavras escorrem pelos cantos dos olhos;
Frias que são, mas justas.
Ninguém disse, deusa da fecundidade, que seria fácil,
Mas tinha de ser...

Já não têm os números, os rostos, as vivências
Mais nada para nos dar,
E por isso tu sabes que tenho de partir.
Partir sem ti,
Como realmente tu e nós queremos,
e deixarmos de ser rascunhos de vidas opiadas
Pelo negro do que éramos outrora.
Mas agora tenho mesmo de partir...

Partir para as estrelas...

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Memórias do tempo



No tempo que não podia fazer espera
No instante em que diluímos todas as vontades,
E partimos...

Nas paredes onde soprava o vento
que nos dava o fim das tréguas,
Onde gastávamos tudo o que não era em vão
e assediávamos o que nos era só a nós, desejado,
Só a nós...

Era a soberba que nos cobria como únicos,
e na arrogância do toque
Que esse tempo jamais poderia levar -
Porque tudo era tão real
como eu desejara ser, alguma vez, real

E com o gesto provocaste
o apagar de todas as minhas vivências,
a moral, o simples respeito pelas memórias.
Mas continuaria a pedir esmolas ao tempo...

(Não era isso que queria!)

Quis presenciar verdadeiro tempo
(aquele que não nos exige as esmolas das lágrimas)
e conhecer tudo o que de belo existia,
e estavas lá...
Insultei os velhos, os doentes, os fracos,
a mim próprio
Mas descubri-te...

E parti sem ti

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Encontro de reticências...

Um dia, meu só meu...
Olhei,
Despertei,
Beijei,
Amei,
Sonhei...

Mas afinal, era tudo tão real,
como qualquer coisa real...
Recordei,
Levei,
Chorei,
Adorei,
E no fim...
Acordei

E morri...
Na traseunte de toda a presunção abstracta,
na idiotia de qualquer vivência,
tão ridículo e banal
como qualquer coisa.
Tão decadente!...

Desejo desprezá-la
(... e revivê-la)

sábado, 18 de outubro de 2008

Lisbon Revisited (2008)



À semelhança d'ontem,
também hoje desprezo o tudo - e o nada

Já tive o poder outrora,
nestas mãos de poeira...
Mas que poder?
Que moral há para dizer que tive a força
Enquanto descobria a fraqueza
que me encobria da luz de todos os fins?!

Desconheço o que é o saber,
a fatalidade das ciências que tudo presumem,
o futuro, o passado, o presente...
Qualquer coisa elas presumem;
inúteis as ciências- como o tudo e o nada

(Mas como vou saber eu das ciências,
que me fazem perder a cabeça,
Se nem eu me conheço a mim?!
Mais vale saborear com Baco
do que ouvir o conluio dessas profecias...)

Por fim,
Revejo-te Lisboa minha
A ti e a mim,
tão decadentes como sempre...
E no alto, em que me fundia contigo,
Cidade onde revisito das tuas muralhas
e vejo lá ao longe,
onde as pessoas já não te pertencem,
o meu coração para lá do pôr do sol.

Redigimos letras e futuros
e gravámos na memória o cheiro da nossa partida
Quando eu era estrangeiro em ti
Descia pelo véu do Tejo
E partira para o meu destino

Mas que destino é o meu?
Nada me prende a nada,
nem o meu próprio destino
Apenas levo-te a ti,
Lisboa minha...

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

O ridículo do poeta



Inúmeras as vezes
que corremos atrás das pequenas poças,
de água no topo do abismo

E tantas outras foram as vezes
que roçamos a pele na perseguição do célebre

E o silêncio meu amor? O Silêncio?
O recatado delito
Na nossa flutuação

E quando me tornavas sóbrio
no seio da tua intimidade?
Sim sóbrio- talvez ridículo,
no meu mais íntimo do ridículo

Mas porquê contigo?
Com essa tua alma efémera?
O porquê de todas as memoráveis danças
que fazias elevar este poeta - Esta carcaça
das letras e dos sentidos

Porquê? Existia algum porquê?
Alguma resposta?
Talvez haveria - há
mas o tempo é doente na resposta

Sei que ia contigo;
Ainda vou
Vou para aquele, nosso refúgio;
Sinto-o contra mim e vejo-te ali
Em todos os desejos sobrepostos

Que mais posso desejar?

terça-feira, 16 de setembro de 2008

A história do mendigo do Chiado

Sobre a calçada preta,
tu gritavas,
e gemias no erotismo do beijo;
E quando escapavas,
pelo exotismo das ruelas,
da poesia do toque
todas as verdades piedosas dançavam,
e bailavam por entre a valsa do alívio,
porque se afastavam de mim
as tormentas do ser amado
Não por aquilo que esperava-mos eu ser
Mas sim, por apesar do que era;
E assim
Todo este conto que me fazia mendigar
era o mais sincero dos diários
que fazia exultar o teu, todo, instante

domingo, 7 de setembro de 2008

O profeta de Nietzsche

Pastor que procureis no trigo
que geravas do caos?
Ceifar o que há do saber e do
conspurcar pelo que é digno?

Mas que saber existe
para a natureza do homem?
É preciso ser...
Ser o animal

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

O Lavrador da cidade

Na génese tertuliana da vida na cidade,
onde não podiam pertencer os privados da razão
protegidos pelas trincheiras do mito profetizado
do proeminente desertor que aspirava ao nada,
todo o barafustar pousava no exumar da ideia
e extinguia-se no parasitismo da pólis,
que louvava o pacial disfarce do bem,

E por momentos, o lavrador ensinava ao aristocrata
que o tropel oriundo do adorado sufista intelectual
conduzia a toda a pústula da sociedade
onde não cabia a elonquência do puritanismo

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

O pensador do Olimpo

No Olimpo,
onde senhores saboreavam do discurso coerente
e manipulavam os gentios no real jogo do xadrez,
Constrangiam o defluir do pensador
que questionava qualquer metáfora abstracta
e que provocava o acordar dos fiéis

O homem,
fiel da religião do ressentimento
Que desposjava do necessário pensamento
Adulterado pela génese filológica dos semideuses
confluía para o caminho dos sacrifícios,
O caminho dos escravos em direcção à Roma do Nada

Porém,
o animal que serenava do ateísmo da palavra,
zumbia por entre o iluminismo do pensamento
e mantinha-se sóbrio ao assédio do discurso incoerente.
Assim ía o pensador do Olimpo, amigo de Narciso,
o pensamento que devolvia ao escravo a sua liberdade

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Metamorfose de carácter



Na chegada da insónia, do manco dedilhar do piano
do despiciendo acto do destronar da pausa
para o condenável concurso do pensar;
O devaneio que devolve ao mancebo a diástole da ideia
a fuga de toda a ambiguidade do sentir,
a diáspora do morganático carácter,
da melodia sedenta que cai no esquecimento do pretexto
E assim, através da mutilação das duas caras
A barca elegia por entre a ortodoxia do rio,
e do liberal da imensidade que se perpectuava
e latia do rugido dos ventos que laureavam a inocuidade
a ingeniudade que bramia da translúcida perífrase
numa falhada tentativa de alimentar toda a ignorância
das naus que oravam para que a foz fosse o final da filosofia

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Mísero texto prosaico

Com o bafejar do acre, do sedento odor,
Que se adensava por entre a meritocracia,
Que jaz do terreno murado e adsorvente de capital;
Pelo mísero adjectivo que pensava ser
todo o expoente máximo da escrita poética
resumia-me em voltas num inútil esforço
que levava à teológica e rimática prosa,
Porque, não queria humilhar a palavra,
daqueles que a usam para versar o instante,
todo o tosco sentimento que falaciosamente sentiam,
numa tentativa desesperada de vangloriar todo o inato
toda a rotina do banal que não interessa a alguém
nem às senhoras que rugem do decote da palavra;
Por isso, cinjo-me à ortodoxia dos deuses,
que como eu, respiravam da cigarrilha,
do sinónimo do mísero texto prosaico e, que no fim
resolviam a busílis de toda a promessa verbal

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Noite



Encerro-me no sopro da esperada morte,
O enclavinhar pelo teu edénico grito
A emulação que me carregas em ti
Tu, noite, que diariamente te revisito

Eufóricos decadentes que aparentam a força
Enquanto resto-me do teu ímpio desprezo
Por os que minam a nobreza do teu sossego,
Daqueles que ignoram o precioso conselho

Vós, senhora, que docemente trucidas a luz
que fustigas o pavoroso "Ai" dos caídos
Que tranquilizas o novato que vive no cárcere
E libertas o sofoco do desejado libertar da raça

Quero em mim o teu pulsar,
o impulsivo pugnar pelo que o é falso,
Tu que representas a certa e justa verdade
Para os que nao acreditam na hipocrisia do dia

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Natural Despedida



Na esquina da erosiva tremura
da débil metáfora que eras
do volátil e desmedido pudor que criavas,
Não podia tresandar mais do teu culto

Não, não podia...
Não podia exceder o triste beijo;
Esquecias-te da natureza minha
do animal que versava a erótica impressão

Porque da turbulenta e absurda hora
nascia a farta e indefida, a rica questão,
o cajado que surgia do monte
e docemente levava à desejada crispação

A música que entoavas era perfeita
Mas escolheste o fácil caminho. Eu fiquei.
Fiquei porque preferiste o rotineiro caos
enquanto buscava a simples razão

Agora despeço-me por instantes
Enquanto vives do tédio do contencioso passado
E tu sabes...O poeta que contagia a frase
Não é igual ao homem que te traz como despesa

Se soubesses a absoluta proximidade que sinto
Aquando te visito a todo o instante
Por momentos acreditas? Nesta veracidade que dito?
A todo o cenário que crias incessantemente?

Sim acredita...Mas no limiar de toda a meditação
No momento em que o tempo exala da razão
Eu peço-me desculpa...
Tudo porque não te poderia "amar"

Eu não te posso amar...Ninguém pode.
Quem to afirma isso mente;
Pediria que eu te amasse mais que a mim
E isso seria viciar a humana razão

Simultaneamente prostrar-me-ei a ti, ao deus
E esperarei por ti, pela moderação do prazer
que me translucidavas em ti; e enquanto
não chega o diletante momento, digo-te adeus.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Ode ao enorme lago



Oh imensidade que manejas a cidadela,
que guardas sem meandros adversos conselhos
que emancipas o desejado éter da razão
Embala-me no enleio do teu sossego

Oh azul que ouves o pouso da riqueza,
do recosto do enorme génio que descansa
dos afeiçoados que veneram o teu esplendor;
Vejo esse nosso acre modo de viver...

Oh mar que gritas o ensurdecedor do adeus
enquanto caminho no teu delicado adarve
Tu que esperas o meu embarque pelo ilustre,
Pela acalmia que causas quando te enfureces

Oh enorme lago que desvaneces em mim a tua espuma
que fazes relembrar todos os sopros da memória,
Deixa sentir o forte, o cruel, o feliz festim
Que acalenta comigo o anseio da poderosa mão

Guarda nesse profundo vazio o enorme respeito
toda a crispação da esfera do vergonhoso refém
que nos prende a vontade do usar do poder,
e que entusiasmas até o mais estéril dos homens...

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Recordação

Nesse muro do brilhante granito,
Da obsolenta varanda que adormece,
Espreito aquele doce e inocente modo...
Todo esse retrato a preto e branco

Olho para a gaveta da enorme frase;
Nela recordo todo o teu prazer sensual,
O encanto da alma, as delícias do coração,
O deslumbre da mera desordem que provocavas

Através daquele sorriso que se diluia
Recordo agora o tão delicado olhar;
Toda aquela esfera de perfeição
Que me fazia despeitar do mundano...

Vivo da tua perfeita recordação,
Do tão desejado abrir da janela,
Da abrastacta e cómoda sensação
que me fazia crescer para ti...

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Silêncio

Entro como espectador da própria escrita;
O instante, a vírgula, toda a sensação
Que impõe a representação das horas vagas

Deixo todo o ideal ascético, toda a moral
Lutarem pela platónica, subjectiva verdade
Enquanto disfruto do prazer do estoicismo;
Esta mísera condição de felicidade

Assisto à maestria do infinito movimento
O cintilar da tranquilidade da alma,
Toda a assimilação da bela, da perfeita dança,
leva à dissipada hora do esquecimento

Debruçar-me-ei sobre essa pobre mesa;
A interpelação que o tempo
me suplica a outras e tão desejadas vivências ,
O rosto da mera satisfação do poder
da enorme rejeição pela vivência mundana,
E que só agora o imperativo relógio
me abre a porta à cor do feliz silêncio

domingo, 6 de abril de 2008

Pedido



Tento descobrir o que é este desejo
Todo o argumento que desvenda o mistério;
basta olhar para o teu pequeno retrato
para tremer como um mero inocente
da sensação a que chamámos de perfeita

Esta névoa está corrompida
pelo sentimento que te apelido;
Beija, abraça, sorri-me simplesmente
Qualquer pedido parece decadente
Mas satisfaz-me esta minha tua necessidade

Deixa-me sentir só mais um instante
esse teu justo e sincero olhar
Leva-me ao estado em que aguardarei
todo o enorme segundo em prazer,
Traz contigo a roubada alegria

Traz contigo a minha descoberta
O tão enorme desejo de cumplicidade
Suporta-me nesse teu doce modo...
Faz-me renascer para o teu respeito
Para o teu ego, para a tua simplicidade

Para o teu amor...

quinta-feira, 3 de abril de 2008

A verdade

Insiro-me na metafísica do culto
Através da preversão do sacerdote
Compro a tão desejada verdade
Mas o que é a verdade?
É o tal amor escondido no oculto?

Quando o meu Fédon se questiona
A que se predestina a vida do Homem
Encontro a soberba pretensão do Anticristo
O niilismo e o dogma aliam-se
Para servir o pequeno deus do homem

Quanto mais me consumo em busca da verdade
sinto-me enojado da servidão à fé
O Homem tem de sofrer, martirizar-se
pois o perfeito ente criado pela rectidão
castiga, faz sofrer aquele que se ama a si

O saber, o conhecimento, a leitura
batalha para a pobre verdade
O dogma enraiza-se na fraca mente
Simplesmente o Homem tem de ter a doença
para alcançar a mentira da plenitude

segunda-feira, 24 de março de 2008

O deus

Deleitado neste cadeirão burocrático
Vejo como um deus as pequenas almas
Vagueando o destino através desse caminho;
Talvez almas maiores que a deste deus

Quanto mais vagueio por páginas do pensamento
em procura ao vácuo que se instala neste poço
mais descubro o quão pequeno este deus é;
Já nem é capaz de responder a si próprio

Ao ver simples flores dançando ao sol
Sem se interrogarem sobre a sua condição
desejo, como o deus, saber cada vez menos;
"A dor de pensar" consome-nos insensatamente

Vou caminhando no seu próprio trilho
No ontem ficou o verdadeiro conhecimento
Pois não mergulhava na maldita questão do ser;
O deus resumia-se à sua riqueza do desconhecido

Esse poço que é verdadeiramente caótico
Através da interrogação idiota e persistente
Leva à cansada vírgula maníaca do saber;
Quanto mais sabe menor é a perfeição do deus

quarta-feira, 12 de março de 2008

A crítica

Vagueio sentado na nuvem viajante;
Para trás fica o movimento
duma perpétua rotina degradante
dum falso e hipócrito contentamento
...
Espreito as escritas redundantes
onde todos saboreiam da mediocridade
dos comentários dos deuses ignorantes
da falsa retórica de serenidade
...
Avança,porém mais uma pequena jornada
Em que o metal vence o pensamento
mascarando o verdadeiro desalento
E que no fim ninguém acredita em nada

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

"Desabafo"

Escrevo por entre estes sons
De podridão, de angustia, de medo
Mas recordando todos aqueles
Momentos nossos tão bons

Agora que não há mais esse carinho
passarei esta pequena vida sentado
Neste estado que me deixa pedrado
De não poder seguir o nosso caminho

Esse manto diarimente profetizado
pela memória que permaneceu no ar
deixou esse estranho ser agoniado
Por nao sentir mais o beijo à beira mar

Foi o tudo o que este ente te deu
Para tras ficou toda essa cumplicidade
que outrora me trouxe felicidade
Mas que agora simplesmente morreu

Aguardarei a tua chegada, essa novidade
Porque so eu vacilarei por esses momentos
que tornaram o nao vivido em tormentos
E renunciarei por ti amor, à fama e à criatividade

"Tu"



Tu...Ser imperfeitamente perfeito
Retrato de um rosto metafísico, transcendente
Onde nem o mais profundo pensamento filosófico penetra
Um delinear de traços, uma suave pele
Um amor por ti diletante

Amar?
Palavra que o passado faz relembrar
Uma quimera e uma utopia no presente
Uma realidade esperada amanhã

Amar depois de Amar
Uma impossibilidade possível
Um sentimento por ti platónico
Tornado real

Tu... Mostras-me o amar
A angústia, a insegurança, o medo
que me apertava o coração quando
Por entre os vidros do meu insconsciente
nao te via a meu lado

Porque tu...
tu és a minha fonte hedonista
um prazer intenso, mas suave
Um girar num turbilhão de sentimentos
Em que todos os instantes
que são gastos longe de ti
são desperdicados

"Amo-te"
Talvez a expressao mais difícil de dizer
Mas que contigo tudo é fácil

Mas tu...tu percebes?
Tu não és apenas o meu consolo
Tu és o complexo labirinto
Onde a cada canto aprendo-te

Tu..Será que percebes?
A ferida que nao sara
por não deixar de pensar em ti

Nesta náusea em que apodreço
Ou melhor apodrecemos
Ficam estas as palavras
Que ditam as nossas regras:
Amo-te